quinta-feira, 17 de novembro de 2022

O Nosso Rio





Beira de rio, raso de água. Entre lodo, plantas e areia, aqueles peixes pequeninos, piabas, furtivamente deslizando. O sol me bate às costas, mas o vento me suaviza o calor. É longe, mas especialmente no tempo. Criança, novamente sou sem maiores máculas. Uma manhã me pertence, como pertence aos meus amiguinhos, esses que brincam, dentro ou fora da água. O tempo os levará e nos esqueceremos uns dos outros. Mas nada disso será por mal. É apenas a vida como ela sempre acontece.

Esta data, que é, como outras, do dia tal dalgum mês, não a lembrarei exatamente quando o futuro chegar. Aqui, à beira deste velho rio, sequer me dou conta de algo mais que o momento. Não sei pescar, nem aprenderei, mas não importa. Mais tarde, observarei minhas mãos enrugadas pelo tempo tanto que passei sob a água. Antes, almoçarei, sem cansaço, afinal, sou criança e não me canso facilmente. A tarde seguirá, lenta e arrastada. Por ora, o rio passa, o tempo passa, sem pressa, e eu cá estou.

Na outra margem há uns barrancos e árvores que fazem sombra, dando ao rio um ar meio sombrio. Não chego ali, pois tenho medo. Ademais, é água mais funda, onde há "poço", dizem os meninos mais afoitos que por lá mergulham. E no comprimento do rio, até onde a vista alcança, seja para um lado ou para o outro, distâncias que nunca conhecerei ao certo. O rio é grande, atravessa diferentes municípios, deságua no mar. Em seu percurso, gentes e histórias, crianças como que, como eu, nesta manhã, também podem estar se banhando, brincando, vivendo suas infâncias, antes que tudo fique muito sério e ninguém tenha mais tempo para banhos de rio.

Um dia, quem sabe, num futuro distante, venha eu a lembrar-me disto e escrever uma crônica. Mas, agora, aqui e à beira deste rio, nem sei o que uma crônica. Ou sei, sabendo-a da maneira mais radical, que é realizando-a diretamente na realidade, tornando-me ela mesma.

A brincadeira termina. Não necessitei de piratas, sereias ou Simbad. Vou para casa. Em verdade, vamos nós,  os meninos todos, felizes e fartos. É um bom tempo este, pois ainda não há crimes vários, nem perdições outras. A cidade cabe em nossos planos, o rio mesmo é um nosso brinquedo, um parque-paraíso. E sabemos que podemos, ou seja, que temos poder, afinal, estamos ainda brotando, fundando vida, como a que, resplandecente, pulsamos nesta manhã na beira do nosso rio.

|Imagem: Grãos de areia em detalhe - Fonte: Google Images


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O Caderno Livre
é um blog em estilo pessoal, informal, leve, sem maiores pretensões. Algo à maneira dos bloguinhos antigos, os do início desta aventura de blogar. Webston Moura, seu administrador, é brasileiro do estado do Ceará, natural de Morada Nova, mas mora em Russas, no Vale do Jaguaribe. É Tecnólogo de Frutos Tropicais e poeta.
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